O poema
João Cabral de Melo Neto
A tinta e a lápis
escrevem-se todos
os versos do mundo.
Que monstros existem
nadando no poço
negro e fecundo?
Que outros deslizam
largando o carvão
de seus ossos?
Como o ser vivo
que é um verso,
um organismo
com sangue e sopro,
pode brotar
de germes mortos?
O papel nem sempre
é branco como
a primeira manhã.
É muitas vezes
o pardo e pobre
papel de embrulho,
é de outras vezes
de carta aérea,
leve de nuvem.
Mas é no papel,
no branco asséptico,
que o verso rebenta.
Como um ser vivo
pode brotar
de um chão mineral?
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