sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Aquele Poema "Eu me chamo Antonio"

E agora, Antônio?


Quando saio de casa, sempre levo um livro comigo, ou um poema, ou um texto curto. Algo que me faça ver palavras. Sim, ver palavras. Nem sempre tenho necessidade de ler, o que preciso é saber que ali – a um palmo de distância – existe uma junção de sílabas, uma lógica de letrinhas prontas para serem lidas.
O grande dilema é saber o que levar. Confesso que não sou muito criterioso. Parto do princípio de que, se o livro está na minha estante, é porque eu o comprei. Então, de alguma forma, ele me interessou: seja pela capa, seja pelo autor, seja por um poema específico, seja pelo impulso que a sociedade de consumo provoca. Ah, minhas fraquezas!
Não tenho apego ─ minha escolha é aleatória: quem estiver ao alcance das minhas mãos vem. E, se não quiser vir, eu puxo pelas orelhas mesmo. Sem dó. Se bem que esses dias o Manuel me negou. Não dei Bandeira. Estiquei os dedos um pouco mais e Carlos estava lá. Sorte que Drummond tem sido fiel companheiro e aceita com timidez eufórica os meus passeios. Saímos de Itabira e fomos a pé até o Arpoador em uma fração de poemas. Paramos em uma pequena lanchonete para reclamar dos preços abusivos, reabastecer o fôlego e matar a fome. Eu, carioca, pedi um sanduíche de queijo minas. Ele, mineirin, quis um carioquinha, o famoso café com um tiquinho de água quente. Um café mais ralo. Invertemos os papéis. (Os guardanapos?)
Poucas palavras foram ditas; outras tantas foram editadas pelo silêncio. Quando se é tímido, as frases ficam zanzando pela cordas vocais do caminho da fala, se arrastam pelo meio-fio e se perdem no céu da boca de um bueiro que a prefeitura se esqueceu de tapar. Ah, as fraquezas da cidade!
Depois de um breve silêncio
inter-calado
com uma longa pausa,
Ele me declamou:
E agora, Antônio? A criatividade sumiu? O guardanapo acabou? Não tem mais trocadilho? E agora, Antônio? Não quer mais beber? A cerveja está mais cara? A barriga não diminuiu? Por que não corre mais? E agora, Antônio? Quem o compartilha? Quem comenta no seu mural? Quem o curte? E agora, Antônio? O que você faz é poesia? É desenho? E agora, Antônio?
Já que eu não me chamo Raimundo, não sou uma rima, muito menos tenho uma solução, me escondi atrás das suas sete faces e voltei para casa como quem volta para a realidade. Fechei o livro. Torci para ninguém mais roubar seus óculos.
Pelas lentes da sua poesia, vejo a grandeza do seu mundo, mundo vasto mundo
e sem beber conhaque − ainda prefiro chope ─ me comovo com seus versos.
Eu não sou o diabo.
A nossa conversa ficou no meio do caminho.
Tinha um Pedro?


*PEDRO GABRIEL nasceu em N’Djamena, capital do Chade, em 1984. Filho de pai suíço e mãe brasileira, chegou ao Brasil aos 12 anos — e até os 13 não formulava uma frase completa em português. A partir da dificuldade na adaptação à língua portuguesa, que lhe exigiu muita observação tanto dos sons quanto da grafia das palavras, Pedro desenvolveu talento e sensibilidade raros para brincar com as letras. É formado em publicidade e propaganda pela ESPM-RJ e criador de “Eu me chamo Antônio”, perfil do Instagram e página do Facebook que deram origem ao livro Eu me chamo Antônio, lançado pela Intrínseca.



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